O Código de Hamurabi
Quando pensamos em
antigos reis pagãos, ideias de justiça e equidade, provavelmente, não são as
primeiras coisas que nos vem à mente. Nós, modernos, somos mais propensos a
imaginá-los como volúveis, déspotas sedentos de poder, sempre prontos para
condenar alguém à morte por qualquer mero capricho. Mas o rei Hamurabi, que
governou uma próspera e florescente Babilônia a quase quatro milênios atrás,
não se encaixa nesse perfil. Ele afirmou ter ajudado a proteger os fracos da
opressão e os estudiosos acreditam que ele tenha promovido uma atmosfera de
justiça e retidão entre seu povo.
Esta crença é
baseada em um objeto que foi descoberto há apenas um século. Ele já ganhou
lugar ao lado da Pedra de Roseta como um dos artefatos mais importantes do
mundo antigo. Trata-se da estela que traz a inscrição do Código de
Hamurabi, cujo estudo lançou luz sobre as leis, a cultura e a vida na antiga
Babilônia.
Descoberta em 1901
pelo arqueólogo francês Jean-Vincent Scheil, na estela podemos ver bem
preservada, a lista da maioria das antigas leis da época. Hoje, o monumento de
basalto está no Museu do Louvre, em Paris. Ele tem 2,13 metros de altura e
claramente foi concebido para exibição pública, como quando foi erguido pela
primeira vez em alguma cidade da antiga Babilônia.
No topo se encontra uma descrição de Hamurabi com Shamash, o deus babilônico da
justiça. Abaixo, estão as colunas onde estão inscritas, na língua acadiana, as
leis de Hamurabi. O monumento tem 16 colunas de texto na parte dianteira e 28
na traseira. Entre prólogo e epílogo (em que Hamurabi invoca os deuses e
discute a grandeza de sua justiça) encontra-se o mais importante do artefato, a
parte onde estão enumeradas quase 300 leis que lançam luz sobre o senso de
justiça dos caldeus, surpreendentemente à frente de seu tempo, em alguns
aspectos.
O Código de Hamurabi
contém uma extensa lista de leis que abriram os olhos dos historiadores para a
sociedade altamente sofisticada da antiga Babilônia.
Quando Scheil
encontrou a estela, os estudiosos, animados com a descoberta, logo publicaram
vários livros e comentários sobre o que ficou conhecido como "Código
de Hamurabi". Os historiadores continuam a discutir o significado do
código e os mistérios dele ainda fascinam a comunidade acadêmica. Ele oferece
vislumbres notáveis sobre a história do direito, da justiça social e até mesmo
da Bíblia. Para entender o porquê, vamos inspecionar alguns dos aspectos mais
importantes do Código de Hamurabi.
As leis do Código de Hamurabi
Inspecionar o Código
de Hamurabi é como olhar através de uma janela para a antiga Babilônia, um
império agrícola com movimentados centros urbanos. Essas leis mantiveram a
estabilidade e permitiram o florescimento da cultura babilônica. Alguns
historiadores afirmam que o código retrata uma sociedade mais avançada e
sofisticada do que a do período medieval na Europa, que começou por volta do
ano 500 depois de Cristo.
Cerca de 100 dessas leis diziam respeito a questões de propriedade e de
comércio, incluindo dívidas, juros e garantias. Por exemplo, se uma barragem
rompesse e subsequentes inundações destruíssem plantações alheias, as leis
abordavam até a negligência do proprietário da barragem, que teria que
compensar os agricultores que porventura perdessem as colheitas. Sendo a
economia da Babilônia baseada em moeda de metal e em permuta, as leis também
estabeleciam determinados padrões e limites para contratos de empréstimo, a fim
de controlar o abuso de usura. O código estipulava que um credor poderia
cobrar, no máximo, 20 por cento de um empréstimo à base de prata e 33,3 por
cento para um empréstimo de grãos. Os credores também tinham que finalizar o
contrato na frente de testemunhas e esperar o tempo da colheita antes de exigir
o reembolso. Além disso, o código aborda a ideia de um empréstimo garantido,
propriedades como terras e casas - ou até mesmo mulheres e crianças
- serviam como garantia. Os devedores, também podiam se tornar escravos
dos credores até que as dívidas fossem pagas.
Outro conjunto de aproximadamente 100 leis lidavam com assuntos familiares, que
abordavam questões desde o casamento, filhos e herança, até adultério e
incesto. Os casamentos eram muitas vezes um acordo comercial entre o futuro
marido e o pai da mulher desejada. O divórcio era possível, embora mais
facilmente para o homem do que para a mulher. O divórcio, quase sempre
implicava no pagamento de uma taxa e, por vezes, era necessário que o marido
devolvesse o dote da esposa. Incesto e adultério da esposa eram puníveis pelo
exílio ou com a morte. O código contempla o pai, como se poderia esperar, como
o chefe da família. Até o filho casar, o pai tinha direitos legais para usá-lo
no trabalho para si ou para seus devedores. Os pais poderiam até mesmo optar por
vender os seus rebentos e se um filho batesse no seu pai, ele teria as mãos
cortadas.
Esta última punição nos remete para a questão das leis penais, bem como para a
natureza da punição no Código de Hamurabi. Alguns estudiosos pensam que este é
o aspecto mais fascinante e significativo do código.
Olho por olho, dente por dente: As punições do Código de Hamurabi
Para manter sua
sociedade estável, o rei Hamurabi instituiu algumas punições muito severas para
determinados crimes. Como já mencionado, a mutilação física era uma opção comum
para a punição; mesmo que isso significasse que as mãos de uma criança ou os
seios de uma mulher tivessem que ser cortados. A morte era outro castigo
habitual. O código menciona explicitamente cerca de 28 crimes cuja pena poderia
ser a morte, entre eles, roubo, adultério e feitiços de bruxaria.
A punição muitas vezes dependia da classe social do agressor. Quando um membro
da elite cometesse um crime grave contra uma pessoa de status inferior, ele ou
ela, podiam ter que simplesmente pagar uma taxa. Quando os papéis fossem
invertidos, o criminoso de classe baixa recebia uma punição mais severa.
Você provavelmente já ouviu falar da antiga lei do "olho por olho e dente
por dente". Por um tempo, as pessoas achavam que essa ideia, chamada lei de talião (lei da
retribuição), originava-se de Moisés e da lei hebraica. A descoberta do Código
de Hamurabi lançou dúvidas sobre essa teoria. O código não só incluía a lei de
talião, mas literalmente ditava essas leis para olhos e dentes. Se um agressor
arrancasse o olho de alguém, ele ou ela, perderia um olho. O mesmo valia para
dentes e ossos. Embora possa ser um pouco bizarro para nossos sentimentos
modernos, isso tudo era perfeitamente racional e justo - pelo menos para
Hamurabi.
Os historiadores ficaram surpresos ao encontrar a ideia da lei de talião em um
código que antecedeu a Lei Mosaica (as
leis de Moisés e dos hebreus) por algumas centenas de anos. Muitos chegaram à
conclusão de que a Lei Mosaica evoluiu a partir do Código de Hamurabi,
entretanto, os estudiosos rapidamente descartaram essa hipótese e passaram a
aceitar que os dois códigos, provavelmente, compartilham uma origem comum.
Existem muitas diferenças significativas entre os dois conjuntos de leis para
concluir que a Lei Mosaica é baseada no Código de Hamurabi. Os historiadores
apontam com frequência que a Lei mosaica é mais humana, e que, enquanto o
Código de Hamurabi designa punições de acordo com a classe social, a Lei
Mosaica não faz essa distinção.
Hoje, continuamos a
estudar o Código de Hamurabi, por várias razões, mas talvez, a mais importante,
seja porque ele lança luz sobre a história da lei de talião. As nações
atuais continuam a lutar com questões do que é justo e ético no combate ao
crime. Talvez, o código de um rei pagão da antiguidade possa oferecer um
contexto para o debate dessa questão.
Irmão messias